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26 abril 2010

116. Canção amiga

"Canção amiga" tem o objetivo de ninar as crianças (símbolos do olhar desautomatizado) e acordar os adultos (tomados como detentores de um olhar por demais objetivo).
A "Canção amiga", que fala "como dois olhos", seria, portanto, o grau zero do canto (a tão desejada harmonia do ser). Espaço em que, acima das convenções (de ser e estar), mas conscientes delas, o sujeito pudesse tocar na vida "como quem ama ou sorri". Para que tudo forme um só diamante.
Milton Nascimento (Clube da esquina 2, 1978) aproveita e potencializa a musicalidade do poema de Carlos Drummmond. O compositor usa as redondilhas maiores (versos de sete sílabas) a fim de iluminar as cores das imagens que o texto propõe, ao som, basicamente, do violão.
A canção deflagra a ternura e simplicidade da existência, em contrapartida à complexidade que teimamos em criar.
Tudo na canção amiga (fraternal) é positivo: desde as metáforas solares, até a dicção natural e coloquial (em tom de recado-convite) de Milton Nascimento. O sujeito, ao cantar, torna as palavras mais belas.
Há ainda os singelos vocalizes feitos por crianças, desdobrando a bonita capa do disco e apontando para "o segredo" de algo que está atrás do muro, basta termos coragem para subir nele e olhar.

***

Canção amiga
(Carlos Drummond de Andrade / Milton Nascimento)

Eu preparo uma canção
em que minha mãe se reconheça,
todas as mães se reconheçam,
e que fale como dois olhos.

Caminho por uma rua
que passa em muitos países.
Se não me vêem, eu vejo
e saúdo velhos amigos.

Eu distribuo um segredo
como quem ama ou sorri.
No jeito mais natural
dois carinhos se procuram.

Minha vida, nossas vidas
formam um só diamante.
Aprendi novas palavras
e tornei outras mais belas.

Eu preparo uma canção
que faça acordar os homens
e adormecer as crianças.

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