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12 outubro 2010

285. 10 contados

Ê Tempo. Ê Tempo Zará Tempo. A saudação ao orixá quer ampliar (abrir campos e iluminá-los) nossa capacidade de fazer o bom uso do Tempo: entendendo o que (e como) precisa ser modificado, ou não, precisa permanecer, mais tempo.
O Tempo a tudo assistiu e a tudo assistirá. Para algumas culturas, ele nos ensina o sentido da vida, pois permanece na impermanência das coisas, ao mesmo modo em que passa (ou seja, é impermanência). Tenho minhas dúvidas se Nietzsche, ao tratar da questão do "eterno retorno", não tratou, de fato, do Tempo: sem o tempo viveríamos o mesmo segundo sempre, aliás, não existiria o "sempre". O retorno, do mesmo e do diferente, dá estabilidade à vida.
Maria do Céu Whitaker Poças é daquelas cantoras que, por trás da aparência doce, guarda uma potência, maturada nas tradições sonoras de nossa história, sempre em movimento para a afirmação da vida. Não é à toa, portanto, seu canto ao Tempo, em "10 contados", de Alec Haiat e Céu (CéU, 2005).
Em suas canções, em sua voz encantadora, mesmo quando lágrimas negras caem, e doem, há uma nítida intenção de que o leite derramado, sobre a natureza morta, despolete novas possibilidades de continuar: vivendo e aprendendo a jogar.
Céu, sua obra, trabalha sobre as não-fronteiras entre as culturas que compõem um país como o Brasil: atenta às novas soluções tecnológicas, usa-as em benefício da canção e do canto. Sem arroubos de falso virtuosismo, mas com respeito e amizade à função sereia de ser.
Com as bênçãos das entidades do Tempo, o sujeito de "10 contados", suspende as barreiras temporais e canta o retorno de seu amor: que não pode se atrasar - perder o rumo do tempo.
Quanto tempo dura uma respiração, ou um suspiro, daquilo que dá equilíbrio à vida? Para o sujeito, nada de segundos: 10 contados - metro e medida ainda por vir, própria daqueles que amam e entendem as mutações climáticas da existência: em que estar ou não estar ao lado do objeto de amor é uma questão de Tempo.
Tempo, tempo, tempo tempo: quatro foram os dias que Olorum levou para criar o mundo; quatro é o dobro dos dois tempos regulamentares de uma partida de futebol; quatro são as estações climáticas do ano; quatro são os elementos da natureza; e quatro é o número de versos iniciados com o vocativo "meu amor", na canção-carta "10 contados": número dos dedos (unhas ruídas: a saudade é testemunha) das mãos.

***

10 Contados
(Alec Haiat / Céu)

Meu amor não se atrase na volta não
Meu amor não, não, não
Meu amor não se atrase na volta não
Meu amor, meu amor, meu amor, quem mandou?

Mandei uma mensagem a jato às entidades do tempo
Já me foi verificado que nem mesmo haverá segundos
Que os minutos foram reavaliados e que pra cada suspiro serão 10 contados

Um comentário:

Alberto Junior disse...

eu queria entender é sua metodologia de pesquisa.
o que é mais interessante nas suas análises são as referências de outras canções e literaturas que você agrega a uma canção.
percebo que você constrói um sentido e um discurso narrativo para cada canção, que incentiva outras leituras e percepções.